quinta-feira, 17 de março de 2011

O Ritual da Espera...

Por Giselle Vergna

Lá pelas oito e trinta da manhã Ela desperta, olha pela janela levantando os braços e esticando-se bem para alongar o corpo, toda cheia de ânimo e de esperança, exatamente como faz em todas as manhãs. Ainda com os braços lá no alto, no alge da espreguiçada, logo pensa: - Hoje Ele vem! Eu sinto! Ele vai me telefonar dizendo que vem.

Em seu desjejum, prefere requentar o café do dia anterior, até porque, não vai fazer café antes Dele chegar e correr o risco dele não gostar do café porque não está fresquinho Imagina, que vergonha!

Enfim, às nove e cinquenta e cinco, de fato, Ele telefona para Ela. - Ele me ligou e disse que vem. Eu não disse que hoje Ele viria? Imediatamente ao desligar o telefone, põe-se a faxinar, limpando e perfumando todos os míseros cantinhos da casa com tamanho asseio que quase tira a tinta dos móveis. Troca a roupa da cama, vestindo-a com a colcha mais nova e mais bonita e espalha no que logo será seu leito de amor um perfume diferente, uma fragrância afrodisíaca _era o que dizia na embalagem_ para deixá-los loucos de desejo ao se deitarem. Às onze e quarenta e sete Ela vai para a cozinha pois também quer pegá-lo pelo estômago. Típico pensamento feminino.

As lágrimas de cortar cebola são inevitáveis, mas ela está feliz. Enquanto separa os ingredientes do prato que vai preparar, ela se perde em seus devaneios, idealizando o passo a passo desde a hora que ele chegar até a hora Dele ir embora, pois sabe que será muito rápido, quase que cronometrado, como sempre são os encontros dos dois. Mesmo assim, ela quer que esteja tudo impecável para o encontro ser perfeito. "Voilà"! O prato está pronto! E ela, orgulhosa, considerando-se "Chef".

Agora vem a parte mais difícil. Entra no banho preocupada se vai conseguir aprontar-se a tempo dele chegar, pois são tantos os detalhes que Ela chega a ficar perdida. Liga o chuveiro e deixa as primeiras gotas frias cairem no chão até que água aqueça a seu gosto. Apanha o sabonete e acaricia-se suavemente, imaginando ser as mãos dele, até que todo seu corpo esteja recoberto pela espuma branca como neve que sai daquele sabonete com hidratante de fórmula especial. Para esfregar-se, usa uma bucha vegetal, confiando no que sua bizavó, avó e mãe diziam: Que a tal bucha deixa a pele mais macia.

O banho terminou, mas Ela ainda deixa a água percorrer seu corpo por mais alguns minutos, enquanto pensa em como vai seduzí-lo. Meia hora  depois, Ela enxuga-se e passa para a próxima fase, a de se vestir. Em frente o espelho, ainda com os cabelos úmidos Ela quase não acredita no que vê. Depois de tanta dedicação na arrumação da casa, todo o seu guarda roupas encontra-se espalhado pela cama, e aquilo não se parecia  nem de longe com um leito de amor. Cruzes!

Ela vestiu-se e despiu-se tantas vezes que, acabou optando por uma "roupinha básica". Vestiu então sua melhor lingerie, um shorts desbotado e uma camiseta regata decotada e coladinha, acreditando que daquela maneira ficaria sexy.

Espere um pouco; que horas são? Uaaaau!  Já passa das duas e meia da tarde. Enquanto Ela se arrumava e tentava enfurnar suas roupas devolta no guarda roupas, perdeu a noção do tempo, o almoço esfriou, ela ainda não fez o café. E também não se deu conta que Ele não deu mais nenhum sinal de vida. Andando impacientemente de um lado para o outro da casa limpa e perfumada, com o telefone celular em uma das mãos, e o maço de cigarros já quase vazio na outra, ela não sabe se telefona para perguntar se ele ainda vem, ou se continua esperando ele chegar ou telefonar. Ela não quer ser a mulher chata e grudenta, mas por outro lado, tem medo Dele achar que ela não se importa. 

Presa nesse dilema e ainda imaginando como seria sua tarde de amor, eis que as cinco e meia da tarde Ele telefona para avisar que (como ela já está acostumada a ouvir), não conseguiu cumprir todos os seus compromissos a tempo e que não virá hoje, mas que amanhã sem falta ele virá, porque está morrendo de saudades. Ela engole o choro, tenta disfarsar a voz embargada e diz: Tudo bem, eu entendo! Amanhã a gente se vê então! Ela requenta o almoço intacto, senta na mesa e come aquela comida já sem sabor, mas sem perder a esperança. Às onze da noite vai deitar-se, novamente romantizando o encontro de amanhã, porque, amanhã, com certeza ele vem.

No dia seguinte, lá pelas oito e trinta da manhã Ela desperta, olha pela janeta levantando os braços e esticando-se bem para alongar o corpo, mais uma vez toda cheia de ânimo e de esperança. Ainda com os braços lá no alto, no alge da espreguiçada, logo pensa: - Hoje Ele vem! Eu sinto! Ele vai me telefonar dizendo que vem.

Denovo, mais ou menos às nove e quarenta e dois Ele telefona dizendo que vem, e, lá vai ela dar um retoque na casa, e...

Um comentário:

Anônimo disse...

algm sente sua falta...